Não! Não Olhe! (filme) & bell hooks: olhar opositivo (teoria)

gi del fuoco
4 min readOct 6, 2022

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Imagem: Historiadora Radical

Bom, você deve estar se perguntando o que uma produção de Jordan Peele tem a ver com bell hooks. Mesmo que isso te traga um certo ponto de interrogação, sei também, que você deve pensar: “ah, isso faz muito sentido…” mesmo sem saber exatamente como.

Vou começar falando sobre o filme, Não! Não Olhe! (2022) é um dos filmes que me faz entender porque eu ao fotografia da forma mais clichê, sim, as fotografias podem contar histórias que por muito tempo foram e/ou são de história silenciadas.

A série tem 2 atores centrais, OJ (Daniel Kaluuya) e Emerald (Keke Palmer), eu acho, além de ter a participação do Brandon Perea, que faz o Angel e instala umas câmeras aqui e acolá (você lembra dele em The OA? Eu sim!)

Bom, conforme o filme vai mostrando o “terror inteligente” que Peele faz, OJ observa algo interessante no objeto que eles estão observando, sim esse monstro alienígenas comedor de humanos, que, talvez, venha do seu de seu conhecimento como treinador de cavalos — lembra que ele, em um trabalho diz para um produtor “não olhe para o cavalo, mas mesmo assim, a pessoa olha e o cavalo se assusta e se defende. Bom, ele observa que a criatura não tem interesse de ir atrás de quem não o olha diretamente. Mas outra coisa interessante é que com a morte do patriarca Otis (Keith David ), que foi atingindo por uma moeda em seu olho, já dava um sinal que olhar, principalmente, para cima não era um bom sinal.

Embora tenha uns símbolos, por exemplo, na frase que abre o filme “Vou jogar sujeira sobre você, tratá-la com desprezo e transformá-la em espetáculo”, que é de algum livro da bíblia. O que busco fazer a partir de agora é relacionar o filme com o que bell hooks nos diz sobre o olhar.

belll hooks nos diz que olhar o tem poder.

E daí, a partir desse ponto que bell hooks traz, eu consigo fazer um ligamento com o filme de Jordan Peele,

“O ‘olhar’ sempre foi político em minha vida.” bell hooks

Quando assisti ao filme, pensei muito sobre o não olhar, não sei se Peele leu hooks, mas eu li e sou uma leitora muito árdua de bell hooks. E quando ela fala sobre “o olhar opositivo” eu não pude deixar de fazer essa relação com o que estava vendo ali na telinha. “As políticas da escravidão, das relações de poder racializadas, eram tais que os escravizados foram privados de seu direito de olhar.”. Ou seja, OJ não olha para o objeto estranho, ele aprendeu isso com a morte do patriarca (seu pai) e ensina os seus a não olharem, no caso, sua irmã, Emerald, Os outros que aparecem na narrativa mais tarde, como o Angel, que, para mim, é uma expressão do latino sem território, mas com uma tecnologia que pretos e pretas nascidos e nascidas nos Estados Unidos não têm, até então, porque não era necessário ter. Bom, o Angel entende “algo estranho num território estranho”. Já, o fotógrafo e cineasta, Fry’s, interpretado por Mark Casimir Dyniewicz Jr., dá uma de branco, né? Nada novo sob o sol. Quer saber mais do que os outros que estão vendo e vivendo aquilo há muito mais tempo, porque, afinal, ele é uma espécie de observador, logo, apaixonado por aquilo que observa, mas, claro, observar demais, por apenas o LUXO DE PODER OLHAR, torna-se uma ação fácil de se tornar fetiche. Franz Fanon já explicou isso.

Assim, como Peele cria através do olhar-não-olhar um jogo de espetáculo. Quem não olha vence e quem vence nessa narrativa apresentada? Quem tem estratégias na forma de olhar.

“Uma vez que eu sabia, quando criança, que o poder de dominação que os adultos exerciam sobre mim e sobre o meu olhar nunca era tão absoluto que me impedisse de ousar olhar, espiar escondida, encarar perigosamente, eu sabia que os escravizados olhavam.” bell hooks

bell hooks nos mostra que através do olhar podemos mudar uma realidade, não foi isso que o filme fez? OJ entendeu as estratégias do monstro, ensinou os seus, enfrentou-o num cenário faroeste, afinal Emerald, venceu também, olhando, através de ferramentas que já tinham no seu espaço, uma câmera fotografa típica de cenários faroeste. Ela conseguiu, de certa forma, olhar e ser vista, pois ela registrou uma caçada incrível que viveu, coisa que ela sempre quis fazer.

E para finalizar, Jordan Peele é a realização de bell hooks nos cinema e na televisão: “quando a maioria das pessoas negras dos Estados Unidos teve a primeira oportunidade de assistir a filmes e à televisão, fez isso totalmente consciente de que a mídia de massa era um sistema de conhecimento e poder que reproduzia a mantinha a supremacia branca.”

Ele ajudou a criar um olhar opositor negro criando um cinema negro.

Assim, como bell hooks, ver televisão (audiovisuais gerais) é uma forma de desenvolver um modo crítico de ser espectadora. Sim, como é. Não, eu não me vi no filme, não foi feito para mim, mas eu sei que o olhar tem poder. Porque, eu também, não pude olhar para muita coisa durante minha vida, mas ao desviar o olhar, eu pude conhecer outras coisas, criar uma realidade alternativa, bem como entender que a ficção é necessária.

Obrigada, hooks. Valeu, Jordan.

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Abraços científicos,

Gi Del Fuoco | Historiadora Radical

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Written by gi del fuoco

Como me ensinaram a linguagem, vou usá-la afiada.

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