Maldito RAP (2022): sim, tudo é mais difícil quando você é mulher

gi del fuoco
7 min readSep 28, 2022

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Imagem: Shondaland

Bom, acho que vocês sabem que eu escrevo sobre produções de mulheres, mas também sobre as mulheres nas obras de áudio visuais, mas isso fica muito melhor quando é sobre uma obra da Issa Rae, que mulher, minhas amigas! Ela consegue colocar as narrativas de mulheres na produção de uma forma tão incrível, logo em “Rap Sh!t” isso não seria diferente.

Bom, essa é uma série da HBO Max (alô, hbo, tão esperando o que para me ter como comentarista oficial?) e fala sobre as mulheres que querem ser rappers. Sim, aqui no Brasil temos uma produção que fala disso, se chama “Antônias” da Tata Amaral. E, bom, como o esperado não é nada fácil.

Primeiro que o filme mostra que os homens envolvidos com o rap, mesmo que tenham certas dificuldades, bem como Issa Rae nos mostra em Insecure (2021), resenha que já tem feita, conseguem ter uma ascensão e estabilidade mais rápida que muitas mulheres, claro isso se dá pelo machismo que faz parte de toda e qualquer estrutura. Com isso, quero falar da história de 3 personagens, na qual, elas se complementam formando uma só: a mulher preta e pobre com sonhos.

Primeiro quero começa com a Shawna, interpretada pela atriz, escritora e comunicadora Aida Osman.

Imagem: Rap Sh!t | HBO Max

A Shawna é uma mulher que dá aquela sensação mista, sim, o amor e o ódio vivem unidos, talvez ela sinta isso por ela mesma, será? Mas por quê? Shawna é uma mulher que trabalha de atendente num hotel, mas que sempre gostou de estudar, escrever e também de rap! Pena que para mulheres proletárias, como Shawna é, você precisa sobreviver e, talvez, mais tarde fazer certas escolhas e entender do que gosta, mas às vezes isso pode ser tarde demais, né? Quantas vezes você precisou trabalhar no que não gosta para poder fazer e trabalhar do que gosta? Bom, a vida toda? Piadas a parte, essa é a vida da Shawna. Ela é mulher com sonhos, ah, tem o relacionamento dela, né? Com um homem negro que conseguiu ir para Nova York ir estudar e trabalhar, mas ela? Largou os estudos, trabalha num hotel e vê o tempo de sonhar ficando cada vez mais afunilado. Então, a vida da Shawna é uma eterna crise, coisa que o RAP, seja ele americano, seja ele brasileiro diz bastante: a crise existencial. Mas, como Issa Rae não brinca em serviço, é uma eterna crise de uma mulher adulta preta e pobre.

Com o final da série fica claro que Shawna só irá entrar mais nessa crise, né? Primeiro que ela é a todo momento questionada pelas colegas de vida, ou seja, pelas moças que estudaram com ela, se ela estudou, ela aprendeu muita coisa, certo? Mas por que ainda continua ali? Por que não conseguiu sair dali e ir para Nova York como seu namorado? Talvez, porque, ela faça algo que muitas de nós fazemos: acreditamos no amanhã porque sonhamos. Mas sonhar demais sem levantar a bunda é só para os/as privilegiados/as, né? Então ela se levanta… claro, com muitos tropeços.

Daí que vem nossa segunda personagem, ela mesma, Mia Knight, interpretada pela maravilhosa Alju Koby Jackson, conhecida profissionalmente como KaMillion e anteriormente Alja Kamillion, ela é uma rapper, cantora, compositora e atriz americana, também participou de um programa que gosto muito o “Amor & Hip Hop”. Sim, amigas, eu amo a cultura hip hop, isso tem um motivo e um deles está sendo escrito aqui.

Imagem: OkayPlayer

Bom, a Mia, sempre quis ser rapper, né? Se envolveu com um cara que faz beat, ou seja, beat maker e se tornou mãe solo. Sim, mãe solo, como dá a entender que sua mãe também foi, e que gostaria de fazer rap. Sempre me pergunto qual a dificuldade que muitos homens, também homens negros têm de assumir e exercer a paternidade? QUAL O PROBLEMA? Mia é amiga de Shaw, mas assim, amigas que só se tornaram amigas porque viram que suas vidas estavam uma merda?! Sim, tenho certeza que você tem uma amiga que te tirou da merda ou você é a amiga que tira outras da merda, logo, uma foi importante para a outra ali. Mas elas são apenas isso, Mia não estudou e não gostava tanto de estudar como a Shaw, isso cria uma grande dificuldade nas comunicações delas, seja como amigas, seja como dupla de rappers.

Imagem: HBO Max

É interessante a série mostrar isso, porque ambas são mulheres que nasceram no mesmo bairro, estudaram na mesma escola, cresceram no mesmo bairro onde tudo isso aconteceu, mas a visão e objetivo de mundo fazem com que elas se afastassem e fossem um tanto estranho uma para a outra. Por exemplo, Mia sente que Shaw, em suas letras, por ser mais intelectual, tem um tom de superioridade e que escreve coisas que ninguém irá se interessar por vir de duas mulheres, já Shaw, não refuta isso, deve ter um fundo de razão nisso, e daí que começa a mudar o comportamento de Shaw… ou seja, ela começa a se sexualizar, antes mesmo de saber que Mia era cam girl, sim, vendia conteúdo digital para pagar suas contas, assustador, né? Mas é o que muitas meninas e mulheres fazem quando estão em estado de vulnerabilidade, mas porque no rap ninguém fala desse tipo de exploração? Por que são mulheres? MALDITO RAP!!!! O rap americano não conseguiu nem denunciar R. Kelly, né? Perdoou Chris Brown que agrediu Rihanna. O que esperar? Enfim, vamos continuar a resenha.

Sim, a série é para adultas e adultos, logo terão cenas desconfortáveis e falas tristes sobre Mia. Principalmente quando ela é vista nos sites pornogr4ficos por amigos do namorado de Shaw. A série em nenhum momento defende esse tipo de exploração, pelo contrário, coloca em imagens muito claras e em diálogos que é muito perigoso é algo misógino, principalmente quando Mia vai para Nova York encontrar um cara, lembra? Calma, não vou dar spoiler.

Bom, quando a dupla entra no que entendemos como o hype, elas começam a ganhar dinheiro, né? Mas para isso elas precisam corresponder com uma feminilidade imposta por ferramentas patriarcais: a feminilidade que se coloca como objeto de prazer, já falei disso, hein? Aqui!

Imagem: VIBE

Infelizmente isso é só a ficção trazendo uma coisa que acontece na realidade, veja as fotos do último álbum da Beyoncé, veja Rihanna, veja Nick Minaj, Card B, enfim, temos muitas mulheres que se sexualizam no rap, não é? Mas essa não é a discussão aqui.

A discussão aqui é:

Independente do caminho que a mulher que seguir, parece que ela tem a obrigação de se colocar como algo passivo, mesmo que a boca dela diga o contrário, no caso aqui, o seu corpo é o objeto de passividade.

Para finalizar, quero falar da minha crush da série, Chastity, interpretada pela atriz Jonica Booth que também participou do programa That’s A Rap. Bom, essa personagem deveria ser melhor desenvolvida? Não sei, talvez, foi intencional deixar um silêncio à ela? Pens que sim.

Imagem: Black Filmage TV

A Chastity é uma cafetina, sim, uma mulher lésbica que não reproduz feminilidade patriarcal e que mora no seu carro, mas que sua principal ocupação é ajudar outras mulheres. Fica claro que ela ajuda outras mulheres e esquece dela mesma, né? Espero que sim.

Pois, veja bem, ela é uma mulher, minha nossa, além de ser “melhor amiga” das mulheres que estão se prostituindo ela os ajuda, ela bate nos homens que as desrespeitam de forma direta e ajuda Mia e a Shaw com sua carreira de rappers. Mas isso não deve ficar claro, né? Bom, A Chastity tem contatos porque ela trabalha com a prostituiç4o, infelizmente, e ela sabe disso. Então, para ajudar as rappers, ela até tem contato de homens influentes do mundo do rap, mas com isso ela não pode ser apenas uma “produtora”, ela trabalha através da cafetinagem nesses eventos, coisa que nenhuma dessas moças entendem. Deve ser difícil, né? Ela gasta todo seu dinheiro investindo nas mulheres, sem que nenhuma delas saibam disso, e que nunca saibam também que ela mora no seu carro, algo que é bem comum nos Estados Unidos. Veja!

Bom, na série, são a história de 3 mulheres que se cruzam no mesmo bairro e que cada uma carrega um sonho consigo mesmo, mas, para pessoas sem privilégios, muitas vezes, para alcançar seus sonhos elas vão para caminhos (não escolhidos) e que podem fazer muito mal para elas mesmas, mas não há escolhas. Desistir não é uma opção, então, penso que a série é sobre vivência, sobre sobreviver, sobre realizar sonhos, mas além disso, sobre reconhecer o que cada uma tem a oferecer ali, agora, naquele momento.

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Beijos científicos…

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Written by gi del fuoco

Como me ensinaram a linguagem, vou usá-la afiada.

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