I may destroy you, 2020

gi del fuoco
2 min readNov 23, 2020

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Primeiro que muitas pessoas ficaram com dúvidas se a série é boa ou não; eu não tive dúvidas que é, primeiro porque eu adoro produções pessoalistas, mas odeio pessoalismo, alguém explica? Eu explico!

Produções pessoalistas tendem parecer que parte sempre do “eu” e termina ai mesmo, mas não enxergo assim, penso que não há como se achar dona do mundo, exclusiva, rainha, suprema, deusa, seja o que for e ser materialista, daí começa os desdobramentos, nossas dores, embora possa ter consequências diferenciadas enquanto subjetividades sempre estão contextualizadas dentro da História; parece redundante, mas é isso mesmo. Nem sempre contexto é História, digo, a sua verdade dentre muitas outras verdades; acho que é isso que o último capítulo tenta mostrar e algumas historiadoras também (risos).

A série contextualiza uma coisa; os abusos. A abusada que comete abuso. O abusado que comete abuso. O abuso do abuso. O abuso.

Porque achamos que estamos imunes de serem abusadores(as)? Essa pergunta te incomoda? Ela não me incomoda, porque eu tento ver abuso como uma das ferramentas de quem tem poder ou quer alcançar o poder, seja em menor grau ou maior grau; e não, não falo só de estupro, falo de atitudes que colocaram outra pessoa em uma situação desconfortável. Você já manipulou alguém para atender seus desejos? Já fez chantagem? Já mentiu? Já usou de alguma tecnologia que você domina para enganar alguém? Já comprou alguém? Por quê? Essa série faz esse questionamento constante e se você tem medo das linguagens do abuso, você não percebe o que ela está querendo te dizer: EM ALGUM CONTEXTO VOCÊ PODE TER SIDO ABUSIVA, INVASIVA E/OU AUTORITÁRIA.

Dói, né. Dói. Reconhecer que contextos podem nos dar pseudospoderes ou, de fato, poderes.

Cabe a você entender o que você defende e porquê defende. Ninguém defende algo só por pessoalismo, porque você não é sozinha no mundo, embora ache que seja e por isso tenta se afirmar nesse discurso falido de qualquer filósofo falido do século XX. Repeti falido duas vezes, repare.

Bom, agradeço demais por essa série ser feita por uma mulher, Michaela Coel e por ter uma linha narrativa e fotografia diferenciada das demais produções de homens, não é original e única, mas é diferente, produções de mulheres são diferentes porque é a nossa verdade e vale deixar claro que é a verdade de mulheres negras (da classe média) inseridas em contextos abusivos, o que torna ainda mais importante a pessoalidade como ponto de fusão.

Eu mesma me vi discutindo com a personagem, quanto sua experiência enquanto mulher negra e a minha experiência quanto mulher, lida como branca, pois é, foram horas de debate por conta de como ela ganhou consciência dos abusos.

Isso que é uma boa série, recomendo demais.

Obrigada à Arabella por brigar comigo no mundo real. Viva à ficção! rsrsrs

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gi del fuoco
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Written by gi del fuoco

Como me ensinaram a linguagem, vou usá-la afiada.

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