Bandida (a número um) 2021: mulheres, o mundo do crime e o amor romântico

gi del fuoco
3 min readOct 14, 2024

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Fonte: Paris Filmes

Esse filme não é genial, mas também está longe de ser considerado um filme ruim, a começar pela direção artística. Talvez aqui, se você não conhece a periferia, a favela, você não verá beleza: mas tem uma beleza em ver as paisagens da favela — a cor do barro tomando conta de tela e dependendo do filtro utilizado, essas cores se misturam formando vários tons terrosos, sempre me encanto com a ideia de terra e favela se encontraram em suas cores, mas esse papo é para outra hora, até porque a beleza está muito no olho de quem vê.

Narrar a história de mulheres no tráfico é sempre um clichê, desde que me entendo por gente nunca vi nada de tão diferente acontecer, pois dificilmente elas entram no crime por suas próprias vontades,

O filme narra a história de Raquel de Oliveira, que se tornou chefe do tráfico na favela da Rocinha. Até aí tudo bem ou não.

Sabemos que as penitenciárias femininas, em sua maioria, é formada por mulheres presas por tráfico, não porque eram líderes ou algo do tipo, mas porque ajudavam seus companheiros em seus trabalhos — a tal da mula.

Para as mulheres, isso é comum, já que somos condicionadas a existir como uma extensão da vida dos homens, independentemente de suas ações. Logo, a vida de Raquel de Oliveira é comum a muitas de nós, o fato dela ter se tornado traficante é apenas uma consequência, não uma condição.

A questão é: suas ações realmente refletem seus próprios desejos ou os desejos de seus parceiros? Digo “parceiros” porque é comum ajustarmos nossos caminhos conforme os relacionamentos, e esse questionamento está profundamente ligado à heterossexualidade.

É claro que não posso ser ingênua, sei que existe dentro das mulheres um desejo quase insano por também poder… poder ter poder. Então, por que não?

Mas é importante lembrar que o poder que chega a uma mulher vindo de instituição como a do patriarcado é um falso poder — pois quando o cenário ferver, seja como for, você será questionada e a primeira a ser sacrificada. Podemos ter o exemplo claro analisando o governo Dilma (2011–2016). Neste caso, no curso da Historiadora Radical “A individualização dos problemas sociais”, você verá o que é o poder patriarcal é com mulheres poderosas.

Logo, mulheres que vencem num sistema que as oprimem, na verdade, não vencem, apenas estão sendo mula de algo maior. Sim, eu sei que dói dizer isso, mas é apenas a realidade.

O filme deixa isso muito claro, o caminho do sucesso de muitas mulheres, é uma negociação, muitas vezes uma negociação da sua própria existência.

O crime é isso: a promessa de uma existência melhor, uma forma de dar vazão à sua invisibilidade. No mundo do crime, você se torna visível, ainda que apenas aos inimigos. Na realidade das periferias, ter respeito significa ser notado. E isso importa.

Sim, eu, particularmente, acho isso desumano, mas não posso negar essa realidade, vi muitos amigos que amei morrendo por simplesmente terem sua vida negada. Assim como Raquel teve.

Filha de empregada doméstica, abandonada ao além, não pelas mulheres de sua vida, antes disso acontecer, essas mulheres foram abandonadas.

Quantas crianças são criadas pela rua? ONDE TÁ A MÃE DESSA CRIANÇA? Talvez a mãe dessa criança esteja cuidando de outra criança, sem folga, dormindo no trabalho limitada ao quartinho da empregada.

Existem muitas raquéis… às vezes dentro de nós mesmas.

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abraços científicos,
gi del fuoco | historiadora radical

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