A importância de documentários como: “Mulher” (2020)

gi del fuoco
4 min readOct 15, 2020

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Uma super produção das cineastas, Anastasia Mikova e Yann Arthus-Bertrand que dá a resposta à pergunta : O que significa ser Mulher? O filme nasceu depois de uma viagem a 50 países, ao longo de 2 anos e meio, em que entrevistaram 2.000 mulheres.

É um retrato íntimo que explora temas como a maternidade, educação, casamento, independência financeira e sexualidade sem essas mulheres falar a palavra feminismo.

Woman, 2020

Com certeza é foi o melhor documentário que vi nos últimos tempos; ao mesmo tempo que é pesado, ele parece voar… Digo, essas mulheres podem falar, falar comigo, falar com você, falar com qualquer outra pessoa que resolvem escutá-las. Você escuta mulheres?

As narrativas se cruzam, se machucam, se doem, se fortalecem, mesmo sendo tão diferente esteticamente de muitas mulheres ali, eu entendi o que a Audre Lorde quis dizer com:

“Não são nossas diferenças que nos separam. É a nossa incapacidade de reconhecer, aceitar e celebrar essas diferenças.”

Eu consegui ver beleza em cada menina e mulher ali, consegui ver porque elas, de fato, estavam bem em falar delas mesmas, mesmo que doa, mas falar é tão importante para nós, não é?

Esses dias abri um livro da Silvia Federici, aquele “Mulheres e caças às bruxas”, numa página qualquer li:

“… as mulheres são as maiores detentoras da memória…”

Realmente, devemos ser mesmo, são as memórias que nos protegem, que nos ajudam a nos defender daquele que ninguém quis registrar; como no documentário demonstra: uma mulher casada com o mesmo homem há 40 anos resolve denunciá-lo por violência doméstica, o policial diz: “você precisa tentar mais, tolerar mais”, mas elas sabia que tolerou demais e tentou demais, suas memórias estavam ali com ela, sua narrativa só foi verbalizada, falada, mas não foi ouvida, mas ela se ouviu e rompeu o casamento de 40 anos.

Esse documentário é tão cheio de detalhes que me faltam palavras para descrever tudo, mas é sobre tudo aquilo que a Teoria Feminista conseguiu reunir; ser mulher no mundo dói. Seja você quem for. As culturas, embora bem contrastantes umas das outras, não relativizam quando o assunto é ser mulher; claro que cada uma vai usar seu melhor mecanismo para violentá-la, mas é tudo parte de um sistema patriarcal; de controle de mulheres.

Na China, com o controle de natalidade, mulheres são obrigadas a abortarem sem seu consentimento, sem elas quererem, na Irlanda, mulheres são proibidas de abortar, são obrigadas a terem os filhos.

As indígenas, como me doeu, mulheres são obrigadas a terem determinados tipos de “piercings” o que elas chamam apenas de furos para serem lidas como bonitas. Homens não precisam ter essa preocupação. Logo, não foi uma escolha esses furos, diferentes dos meus, que foram uma escolha, podendo até ser questionada. Mas não parte do mesmo princípio de aceitação que essas mulheres indígenas precisam para “viver em harmonia” em suas comunidades.

E a mutilação genital? “Eu tinha 5 anos e um pedaço da minha carne foi arrancado de mim, foi a pior dor da minha vida e eu nem sabia porque estavam fazendo aquilo…” “…porque você é menina.”. O relato dessa mulher do continente africano me doeu, pela entonação da sua voz, pela vontade que ela estava tendo de falar, pelo lugar que ela queria ocupar e ocupou!

E o ISIS? Antes, viva às mulheres de Rojava que combatem em luta armada esse sistema de venda de mulheres e meninas; esse sistema que estupram mulheres árabes e as trocam por um maço de cigarro.

O tráfico humano sexual bateu recorde em 2019, 63% das vítimas são mulheres e meninas e 71% são para fins de exploração sexual. (ONU)

E as mulheres de mais de 60 anos? Que lindo vê-las falando, não é? Muitas delas só conseguem se ver agora , graças a muito da nossa luta, nossa luta também são por elas.

“Onde eu estive por todos esses anos?”

Não é só um questionamento dessas senhoras, é um questionamento de muitas meninas e mulheres que tiveram suas vidas invadidas, traficadas violentadas e exploradas diariamente.

Parece que “o que é ser mulher” sempre vai vir acompanhado do vermelho sangue, porque além da nossa menstruação, que muitas meninas na Índia morrem por conta do isolamento que sofrem quando menstruam, somos agredidas constantemente.

Não precisa ser violência física, como disse uma mulher do continente europeu no documentário, “… às vezes ele só socava a parede e arremessava coisas…”.

Quantos traumas precisamos ter?

O sistema é violento com mulheres, seja ela qual for, se você é mulher você sofrerá por isso, claro que mulheres brancas estarão em privilégios entre mulheres negras, mulheres ricas entre mulheres pobres, mas nunca por conta de seu sexo.

Por isso a nossa luta é pela libertação de todas as mulheres e pela queda do capitalismo que fomenta ainda mais o machismo sistemático.

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gi del fuoco
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Written by gi del fuoco

Como me ensinaram a linguagem, vou usá-la afiada.

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